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Azeites: Sandro Marques explica tudo o que você precisa saber

Prática • 29 de outubro de 2021

Você já parou para pensar em como os azeites são elementos fundamentais na gastronomia? Presente na culinária desde 1200 a.C, esse produto é utilizado nos mais diversos pratos e preparos e deve ser escolhido com cuidado.

Mas como selecionar os melhores azeites e como identificar produtos fraudados? Conversamos com Sandro Marques, autor do primeiro Guia de Azeites Brasileiros para tirar essas e outras dúvidas. Confira a seguir.

Prática: Como você iniciou no ramo de degustação de azeites?

Sandro: Minha carreira profissional foi construída na área de Inovação. Em 2008, decidi, por hobby, fazer uma pós-graduação do SENAC chamada Gastronomia: História e Cultura.

Acabei juntando, sem querer, a paixão pela comida com o conhecimento profissional, sempre atento às tendências de mercado. Notei o crescimento do mercado de azeites no Brasil e decidi me especializar no tema.

Fiz a formação da ONAOO, que dura 3 anos, e é a mais tradicional e renomada da Itália. Escrevi o primeiro guia de azeites brasileiros, que já está na terceira edição, e fui o primeiro brasileiro convidado a participar do New York International Olive Oil Competition, uma da mais prestigiadas competições de azeite do mundo, que avalia anualmente mais de 1.000 amostras de azeites do mundo todo.

Prática: Há algum curso específico para quem queira ingressar na carreira?

Sandro: A oferta de cursos no Brasil é pequena, praticamente restrita a cursos de iniciação ao tema, sem grande aprofundamento. 

Na Europa, contudo, é possível fazer cursos mais aprofundados, que emitem o certificado de idoneidade fisiológica, atestando a capacidade do degustador para identificar corretamente os atributos e defeitos de um azeite.

Prática: Quais as características de um azeite de qualidade?

Sandro: Dá para resumir em uma palavra: frescor. A azeitona é uma fruta e o azeite é o seu suco. Quanto mais fresco, melhor o sabor e mais íntegras as suas características nutricionais.

Prática: Como identificar os azeites fraudados ou de qualidade inferior?

Sandro: Há vários tipos de fraudes envolvendo o azeite, desde a mistura com outros tipos de óleo até a mistura de azeites de diferentes qualidades vendidos como azeite extravirgem. Algumas dessas fraudes são detectáveis apenas em laboratório.

O MAPA (Ministério da Agricultura) tem feito um bom trabalho no Brasil nos últimos anos com a apreensão de lotes de azeite adulterado.

Para o consumidor final, algumas dicas são bem úteis: quanto maior o aroma de frescor, grama ou erva cortada, maior a qualidade do azeite.

Se o azeite tem aroma de azeitonas ou patê de azeitonas, é mal sinal: pode ter sido elaborado com azeitonas já deterioradas (semelhante a um suco em que foram espremidas várias laranjas e uma delas já estava passada). 

Por fim, é importante sempre comprar o azeite da safra mais recente, já que a oliveira só produz azeitonas uma vez por ano.

Prática: Quais os principais tipos de azeite e qual o mais indicado para cada uso?

Sandro: Um azeite pode ser produzido a partir de uma única variedade de azeitona (monovarietal) ou um blend de diversas variedades. Cada uma dessas variedades vai ter características específicas.

Azeites produzidos com a variedade arbequina, muito cultivada pelos produtores brasileiros, são mais suaves, às vezes até doces e com aroma e nota de frutas tropicais.Já os azeites produzidos com a variedade coratina são intensos e tem amargor e picância pronunciados.

Entre um extremo e outro, há muitas gradações e variações sutis de sabor e aroma. De maneira geral, a escolha de um azeite é feita em função da intensidade do prato em que vai ser usado.

Um azeite muito potente, como os produzidos a partir das variedades coratina ou koroneiki, pode sobrepujar o sabor de um peixe suave, como o linguado. Azeites muito suaves podem desaparecer numa salada de rúcula e agrião. Pratos feitos à base de grãos (feijões, grão de bico, lentilhas) são muito versáteis e uma boa opção para se testar a harmonização com azeites.

Prática: O azeite saborizado é uma boa opção? Quando deve ser utilizado?

Sandro: Os azeites de alta qualidade tem características aromáticas tão incríveis que é uma pena adicionar outros aromas a eles.

No entanto, existem vários azeites saborizados interessantes no mercado, com aromas que vão desde limão siciliano, que fica ótimo para finalizar queijos e sobremesas , até alguns com aroma de defumado, ótimos para grelhar.

Azeites com aroma de trufa, apesar de um grande apelo comercial, costumam ser fortes demais e, na maioria das vezes, produzidos com aromas artificiais.

Prática: Qual a diferença entre um azeite virgem e um extravirgem? Qual a aplicabilidade de cada um?

Sandro: Há um conjunto de parâmetros químicos, aferidos em laboratório, e de parâmetros organolépticos, analisados por um painel sensorial, que diferenciam um azeite extravirgem de um azeite virgem.

Do ponto de vista da qualidade de gordura e seus benefícios para a saúde, ambos são semelhantes. O que diferencia um extravirgem é a qualidade do seu aroma e sabor, sempre superiores, e a maior presença de biofenóis.

Os biofenóis são elementos naturais produzidos pelas plantas. Alguns deles são exclusivos das oliveiras e têm relação com a prevenção de várias doenças. É curioso notar que essas descobertas são recentes, embora a sabedoria popular ancestral já usava o azeite como remédio há milênios.

Prática: Azeites com apelos comerciais como “colhido sob o luar”, apresentam realmente alguma qualidade excepcional?

Sandro: Quanto mais rápido o tempo entre colheita e processamento, melhor a qualidade do azeite. Azeitonas colhidas à noite podem se beneficiar da temperatura mais amena e manter sua integridade até chegarem ao lagar.

É uma condição de qualidade que foi bem explorada pelo marketing. “Colhidas ao luar” é muito mais interessante do que “colhidas no período noturno?” e evoca a imagem romântica de camponeses, mas é importante lembrar que em grandes produções a colheita é feita por máquinas. 

Prática: Como conservar as características sensoriais do azeite por mais tempo?

Sandro: Por ser um produto proveniente de uma fruta, a sua degradação é um processo natural. Não significa que com o passar do tempo o azeite vai causar danos à saúde, mas ele vai perdendo aroma, sabor e propriedades saudáveis.

Para conservar, é preciso escolher sempre garrafas escuras e guardá-las longe de fontes de calor. Ao serem abertas, devem ser consumidas em poucas semanas. Os azeites mais especiais eu guardo numa adega, como os vinhos.

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