Pastel de Belém: entenda a força da marca registrada

Prática • 10 de junho de 2025

O nome “Pastel de Belém” é conhecido mundialmente e evoca imediatamente a imagem de um doce português de massa folhada e recheio cremoso, servido quente e polvilhado com canela.


No entanto, o que muitos consumidores não sabem — e o que todo empreendedor do setor alimentício deve entender — é que esse nome não se refere apenas a um tipo de produto, mas a uma marca registrada, com implicações legais e comerciais significativas.


Neste conteúdo, você conhece a história, os cuidados legais e os aprendizados que este caso traz para quem trabalha com panificação, confeitaria e alimentação.


Origem: da tradição monástica à exclusividade comercial


A história do Pastel de Belém está ligada ao Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa. No início do século XIX, monges produziam os doces como forma de sustento. Após a extinção das ordens religiosas em Portugal (1834), a receita foi passada a um empresário local que, em 1837, fundou a Antiga Confeitaria de Belém, ao lado do mosteiro. Desde então, a produção do doce segundo a receita original tornou-se exclusiva da confeitaria, que fez do nome uma marca de identidade e prestígio.


Hoje, apenas os produtos fabricados por essa empresa, seguindo o método tradicional e secreto, podem ser comercializados com esse nome. Os demais doces semelhantes, mesmo que visualmente idênticos, devem ser chamados de pastel de nata.


Registro de marca: proteção jurídica e barreira de mercado


A Antiga Confeitaria de Belém detém o registro da marca “Pastel de Belém” junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) em Portugal. Isso significa que:


  • O uso comercial do nome está legalmente restrito à empresa titular da marca.
  • O nome não pode ser utilizado por outros fabricantes ou estabelecimentos para designar produtos semelhantes.
  • A violação da marca pode resultar em processos por infração de direitos de propriedade industrial.


Essa proteção vai além do nome. A confeitaria protege também aspectos do processo de produção, mantendo em segredo a receita, que é conhecida por apenas alguns mestres pasteleiros, contratados sob rígidos acordos de confidencialidade.


Pastel de nata: alternativa viável e sem restrições


Para empreendedores do setor de alimentação, a existência de uma marca registrada não impede a comercialização de produtos similares. A versão genérica, o pastel de nata, está livre de amarras jurídicas e pode ser produzida e vendida livremente, inclusive com variações na receita, formato, recheios e apresentações.


Empresas de confeitaria, padarias artesanais, cafeterias e até grandes redes de supermercados oferecem suas versões do doce, aproveitando a familiaridade do consumidor com o produto, mas sempre com a designação correta: pastel de nata.


Lições estratégicas para empreendedores


O caso do Pastel de Belém oferece diversas lições valiosas para quem atua no ramo da alimentação:


1. Proteção da propriedade intelectual


Registrar marcas, nomes de produtos e, quando possível, aspectos do processo de fabricação, é uma medida fundamental para proteger diferenciais competitivos. A Antiga Confeitaria de Belém transformou um produto tradicional em um ativo de marca exclusivo.


2. Construção de valor por meio da narrativa


A valorização da origem, da tradição e do processo artesanal tornou-o mais do que um produto: ele representa uma experiência cultural para o consumidor (mesmo que se evite o uso dessa expressão em textos técnicos). Esse capital simbólico contribui diretamente para o posicionamento premium da marca.


3. Diferenciação como estratégia de mercado


Mesmo que outros produtos sejam similares em sabor e aparência, a diferenciação por nome, história e reputação permite à Antiga Confeitaria de Belém cobrar preços mais altos e manter uma clientela fiel. É um exemplo claro de como branding e storytelling agregam valor ao produto.


4. Limites do uso comercial de termos consagrados


Empreendedores devem estar atentos ao uso de nomes populares que, na prática, são marcas registradas. Isso vale não só para o Pastel de Belém, mas para diversos produtos alimentícios com denominações de origem ou registros de marca ativos — como o Parmigiano Reggiano, Champagne ou até doces brasileiros com versões protegidas.


Riscos de uso indevido da marca


Empresas que utilizam a marca “Pastel de Belém” sem autorização podem ser alvo de ações legais por uso indevido de marca registrada, o que inclui:


  • Apreensão de produtos;
  • Notificações extrajudiciais e multas;
  • Processos por danos morais ou materiais;
  • Danos à reputação da empresa.


Portanto, o uso correto da nomenclatura é não apenas uma questão de ética profissional, mas também uma prática de compliance jurídico e proteção da imagem do negócio.


Como agregar valor sem infringir a marca


Mesmo respeitando os limites legais, é possível inovar e se destacar no mercado de doces portugueses com as seguintes estratégias:


  • Criação de uma receita própria de pastel de nata, com identidade sensorial definida.
  • Investimento em qualidade de ingredientes, como manteiga de origem controlada ou ovos caipiras.
  • Produção artesanal com transparência no processo, valorizando o feito à mão.
  • Comunicação clara sobre a inspiração no tradicional doce português, sem usar o nome protegido.
  • Exploração de versões criativas, como recheios diferenciados (chocolate, pistache, doce de leite) ou formatos alternativos.


Conclusão


O Pastel de Belém é um exemplo emblemático de como um produto gastronômico pode se tornar um símbolo cultural e uma marca de alto valor comercial, desde que sustentado por estratégia, tradição e proteção legal.


Para empreendedores do setor de alimentos, compreender os limites e possibilidades do uso de nomes registrados é essencial para operar com segurança e visão de longo prazo.


Mais do que replicar um doce famoso, o desafio e a oportunidade estão em criar algo com identidade própria — e, quem sabe, transformar também sua criação em uma referência nacional ou internacional no futuro.


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